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Sabrina - a enfermeira de Urgencia / A&E

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A cultura de uma A&E, como o próprio nome incita, é uma cultura onde não existe a palavra rotina mas antes a palavra imprevisto, exigindo uma grande adaptabilidade profissional e uma vincada assertividade, além de competências clínicas que se destaquem em tempo real, o imediatamente. Os termos essenciais para se definir o dia-a-dia numa emergência são o Team Work, ABCDE e Breach Time – tempo máximo de permanência do utente desde o momento de chegada até ao momento em que tem alta da emergência, sendo esse tempo no máximo de quatro horas, de acordo com os targets nacionais.

Este artigo está dividido em quatro partes, sendo elas: a organização do departamento; os sons da emergência; perfil de um enfermeiro de emergência; aspetos positivos e negativos de uma carreira em emergência hospitalar. Destaco que pretendo retratar a minha experiência em específico, o que obviamente implica que diferentes colegas tenham diferentes experiências e construído outras opiniões sobre o mesmo tema.

Organização do departamento 
A A&E onde trabalho está organizada em seis áreas, sendo elas a triagem, minors, majors, resus, CDU – Clinical Decision Unit e paediatrics. Informação relativa ao tipo de cuidados que se prestam em cada área pode ser facilmente consultada na internet. Os utentes chegam ao A&E de quatro formas: pelos seus próprios meios e por decisão própria; pelos seus próprios meios mas referenciados pelo médico de família; por ambulância porque o utente ligou 999 ou alguém ligou por ele e finalmente; isto só em casos de ser um utente crítico, é ativado o Red Phone (que vai ser explicado posteriormente), e o utente chega de ambulância ou helicóptero, prosseguindo diretamente para resus. Nos outros casos, seja por ambulância ou pelos seus próprios meios, todos os utentes são avaliados pelos enfermeiros de triagem no momento de chegada ao A&E e é estabelecida a prioridade.

Como enfermeira de emergência faço a rotação por todas as áreas do departamento, sendo que num turno posso trabalhar em majors a lidar com, por exemplo, uma apendicite aguda, uma exacerbação de DPOC ou um enfarte agudo do miocárdio, como no dia a seguir posso estar a fazer compressões torácicas a um utente em paragem cardíaca em resus, ou a lidar com um choque hipovolêmico ou um trauma que resultou numa ECG de 3/15, numas hemorragias intracranianas e numas fraturas da coluna vertebral. No turno seguinte poderei trabalhar em minors onde estarei a realizar tratamento a uma ferida traumática ou a colocar gesso num membro fraturado, e no último turno posso possivelmente estar na CDU, num ambiente mais parecido com uma enfermaria, onde os utentes podem permanecer para além das quatro horas para observação clínica ou para referenciação para serviços sociais, tendo a possibilidade de oferecer um cuidado mais holístico.

A&E é sem dúvida, a maior porta de entrada de um hospital, o filtro, o geral, a casa que primeiro recebe todas as doenças, tragédias, perdidos e achados. Além disso, distingue-se consideravelmente das enfermarias do UK pois tem uma forma bastante diferente de se trabalhar, dado não haver um turno com “aquele” doente e “aquela” patologia” e “aquelas” necessidades de Enfermagem e aquele conhecimento mais profundo do utente. Em A&E, como eu costumo dizer, os utentes chegam sem legendas, sem as notas clínicas, não sabemos basicamente nada sobre ele e temos de constantemente começar do nada, descobrir do nada e agir de acordo com as novas descobertas que fazemos. Passadas duas horas já outro utente ocupa a mesma cama e tudo recomeça outra vez. Além disso, a linha que divide os diferentes domínios de competência profissional é muito ténue, o que acaba por se refletir na prática, sendo que há médicos a administrar medicamentos, monitorizar sinais vitais, assim como, pelo contrário, há enfermeiros que fazem o requerimento de x rays, referem doentes para especialistas e antecipam o tratamento. O objetivo do dia balanceia entre salvar vidas e respeitar o Breach Time, e sendo estes conceitos um pouco inimigos um do outro, só com uma equipa que partilhe tarefas é que se consegue seguir uma linha de qualidade de cuidados que possa ser prestada em tempo real para uma A&E, isto é, num máximo de quatro horas.

Sons
Na minha opinião, se precisamos que algo seja dito a alto volume, é porque esse algo é importante de se ser dito. Logo, os sons que apresentados de seguida são mais específicos de situações críticas vindas de resus, e ajudam mais na compreensão do funcionamento do dessa área em específico.


Red phone - situado em resus é o telefone que é mais rapidamente atendido no planeta e permite informar da chegada de uma ambulância ou helicóptero, descrever demasiado sucintamente a gravidade da situação para podermos acionar todos os meios necessários, sejam eles humanos ou materiais, como por exemplo chamar o anestesista se suspeitarmos que o utente irá precisar de entubação oro traqueal, ou a equipa de trauma quando se tratar, como o nome indica, de um trauma.

Microfone - num departamento de dimensões tão grandes, esta é a melhor e mais rápida forma de comunicação. Depois de se receber a informação pelo Red phone, informa-se para todo o departamento o que é de esperar, por uma questão de mobilização de recursos, nomeadamente, a rotação interna de enfermeiros, de acordo com as necessidades de cada área. Frases como Trauma Call in x minutes, Medical priority, x minutes, Cardiac arrest, x minutes são ditas no referido microfone.

Aquilo que mais disturba potencialmente o departamento é quando se ouve dizer “Major trauma incident declared”, o que significa que, por exemplo, como centro de trauma e hospital central londrino que somos, iremos receber subitamente e simultaneamente um número significante de utentes resultantes por exemplo de um acidente de autocarro, avião, uma explosão numa fábrica, etc., o que pode destabilizar o normal funcionamento do departamento. Perante esta exigência, será necessário evacuar rapidamente o departamento, de modo a criar condições para receber aquilo que é esperado e a partir daí regemo-nos pelo “saving lifes and, if you can’t be good, be safe”.

Outros sons - noites de fim-de-semana obviamente que se ouvem demasiados “Pis”, em variadíssimas línguas, e o ambiente torna-se de tal forma intoxicado de consumidores de álcool e drogas, que ainda têm o talento de pedir analgesia opióide para completar o cocktail, que o som mais ouvido é o “Security to X area please”.

Perfil
E depois de ouvirmos os best hits da emergência, seria pertinente definir aquilo que eu considero que constituem as competências/características essenciais de um enfermeiro na A&E. É essencial ser-se proactivo, assertivo e antecipar-se, isto é, iniciar o que como competentes profissionais de saúde que somos, sabemos iniciar porque temos as competências clínicas necessárias para realizar um exame físico básico, definir necessidades e prioridades em saúde e decidir intervenções. O pensar rápido e estar confortável na abordagem do ABCDE também se revela de extrema importância. É preciso saber lidar bem com o stress, gostar do imprevisto, gerir os nossos níveis de adrenalina e os do utente também, principalmente em caso de paragem cardíaca, intravenosamente. Além disso, é necessário gerir a pressão de estarem umas dez ou vinte pessoas a volta do utente a espera que tu, porque és enfermeira, saibas realizar o teu papel em tempo útil e eficazmente e tenhas humildade suficiente para pedir ajuda quando sabes que não és capaz.

Sentido de humor é crucial para perspetivar toda a desgraça a que se assiste, como quando se presencia uns pais, vítimas de acidente rodoviário, que não sabem se sairão do hospital a pé ou de cadeira de rodas, que se questionam do porquê de não terem usado o cinto de segurança no filho, que têm a seu lado e que ainda não se sabe se poderá voltar a ser a criança lúcida que era. É preciso muito distanciamento das situações, pois assiste-se em primeira fila ao pior dia das vidas de uma família e observa-se marcadamente o sofrimento e as demonstrações de afeto, que nos fazem por vezes derreter por dentro e até mesmo questionar sobre a forma como vivemos a nossa própria vida também. É necessário ainda saber gerir o sentimento de “pena”, e não deixá-lo consumir-nos, quando por exemplo recebemos um idoso, claramente desnutrido e desidratado, que esteve sete dias caído no chão sem se conseguir levantar, um desconhecido da sociedade, deixado ao acaso, cuja única preocupação que tem quando chega ao hospital é o seu gato que deixou sozinho e não tem o que comer. E como neste país algumas coisas ainda funcionam, a polícia foi a casa do senhor e resgatou o gato. E a história acaba bem, às vezes…

 É necessária ainda uma certa frieza, pois nem sempre os seres humanos são vítimas, são muitas das vezes culpados. Numa A&E recebem-se criminosos acompanhados de polícias e reporta-se muitos possíveis acompanhantes de cela dos primeiros, pois abandonam idosos e crianças a porta de um hospital, pois abusam sexualmente de pessoas com necessidades especiais, ou porque decidiram esfaquear inimigos ou negligenciar aqueles de quem cuidam. As questões de adultos e crianças vulneráveis, abuso e proteção de utentes está muito presente no pensamento de qualquer enfermeiro e há imensa pressão política no UK nesse sentido. No entanto, dada a escassez de tempo em emergência, por vezes é difícil de identificar que estamos perante uma situação de abuso, daí que qualquer pormenor deverá ser sinalizado imediatamente e discutido com alguém mais experiente, para que não se deixe escapar a oportunidade de tirar alguém duma vida de sofrimento e humilhação.

Aspetos positivos
A&E é uma grande escola de Enfermagem Generalista, que se foca em aspetos específicos de urgência e emergência, especialmente em minors e resus. A rotação entre as diferentes áreas do departamento oferece uma capacidade de adaptação a novas situações e um leque de conhecimento e experiência muito vasta, o que nos torna, obviamente, melhores enfermeiros.

A carreira em emergência desenvolve muito rapidamente a assertividade pois há que saber como lidar com reclamações de tempos de espera, pois cada utente sente que a sua dor é maior do que a dos outros, chegando mesmo a tornarem-se agressivos ou a encenarem desmaios para serem atendidos antes dos utentes mais prioritários. Oferecemos tolerância zero em relação a abuso contra os profissionais de saúde e estamos autorizados a convidar as pessoas a sair ou a obrigá-las, por força dos seguranças, a sair do departamento. O nosso lema é que, se uma pessoa consegue gritar, a airway está patente sem dúvida, se ainda por cima consegue encenar que desmaia, é porque é esperto suficiente para se assumir a existência de alguma espécie de função cerebral. Se executa os movimentos, muito gloriosos de se ver, de uma queda encenada, que são lentos de forma a não bater com a cabeça no chão, porque isso sim dói, é porque consegue ter uma boa coordenação de movimentos logo, e pelas razões anteriores, eventualmente não precisa de estar numa emergência – talvez não faça muito sentido, mas esta teoria ainda está em aprovação… Por mim mesma… Além disso, o pensar criticamente em tempo útil e as oportunidades de carreira caracterizam bem o lado positivo de trabalhar numa A&E, dado que sendo uma área tão exigente e tão abrangente, que oferece tantas competências clínicas e humanas, tem a chave de todas as portas possíveis de serem abertas na carreira de Enfermagem.

Outro dos pontos positivos da A&E é a destreza técnica que dá, dado o vasto número de inserção de cateteres urinários, cateteres venosos periféricos, sondas naso gástricas, etc. que são necessários realizar.

Aspetos negativos
Considero que o stress e possivelmente o burnout é bastante sentido na A&E, daí que é necessário um bom controlo das emoções, um bom suporte da equipa de trabalho e obviamente, do grupo de amigos e família. Outro aspeto negativo é que a probabilidade de se cometer erros é maior, dado que estamos responsáveis por utentes que estão em cadeiras, em macas, em camas, nos corredores, e mudam rapidamente de localização, para que a mesma cama pode ter já o seu 30º doente diferente. Além disso, numa situação de emergência é administrada muita terapêutica, sem se saber o estado de reações alérgicas do utente, sem uma prescrição formal em papel e, obviamente que sendo a “pressa a inimiga da perfeição”, a probabilidade de se cometerem erros aumenta, daí que o cuidado deve ser redobrado.

E por hoje fico-me por aqui!

Um grande abraço colegas,

Sabrina Ferreira


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